09/02/2017 às 10h23
Como evoluímos dos computadores humanos à inteligência artificial
Antes, os seres humanos eram os computadores; em breve, os computadores pensarão como os seres humanos
Tecnologia
Inteligência artificial: máquinas imitam forma de pensar dos humanos, mas aprendem com mais eficiência (Thinkstock/Como evoluímos dos computadores humanos à inteligência artificial)
Antes, os seres humanos eram os computadores; em breve, os computadores pensarão como os seres humanos
São Paulo – “Estrelas Além do Tempo”, que teve sua estreia no Brasil na semana passada, é uma aula de história em formato de filme. Ao contar como três cientistas negras mudaram os rumos da corrida espacial, o longa acaba – por tabela – mostrando o início da parceria entre os seres humanos e os computadores.
Antes de os computadores existirem, as pessoas eram responsáveis por solucionarem equações complexas. Chamados de “computadores humanos”, esses indivíduos foram cruciais na Segunda Guerra Mundial e na Guerra Fria.
No entanto, com o aumento na complexidade dos dados que deveriam ser computados, essas pessoas começaram a ser substituídas por máquinas. Em “Estrelas Além do Tempo”, o computador 7090 da IBM ganha destaque porque foi adquirido pela Nasa para calcular a trajetória das sondas que levariam astronautas ao espaço.
O 7090, porém, está longe de ser o primeiro computador já criado. “A era computacional começou bem antes”, explica Thiago Rotta, líder de soluções para IBM Watson, em entrevista a EXAME.com. Segundo ele, a história da computação pode ser dividida em três grandes eras.
A primeira é a dos sistemas tabuladores – aquele dos cartões perfurados. Eles foram criados em 1890 pela empresa precursora da IBM e, de acordo com Rotta, foram essenciais para agilizar as pesquisas do censo norte-americano. “O censo levava, em média, 10 anos para ficar pronto. Com as máquinas, foi possível diminuir essa espera.” No Brasil, a IBM também foi responsável por fazer o censo demográfico de 1920.
Sistemas programáveis e cognitivos
Na década de 1950, tem início a era dos sistemas programáveis. “Os computadores ficam muito mais ágeis devido aos transistores. Os cientistas poderiam programa-los para executar determinas ações”, explica o líder de soluções para IBM Watson.
Essa evolução é mostrada no filme quando a cientista Dorothy Vaughan (interpretada pela atriz Octavia Spencer) começa a aprender a linguagem de programação FORTRAN. Desenvolvido pela IBM para aplicações científicas e de engenharia, o FORTRAN foi usado para programar o computador 7090 para que ele calculasse o trajeto das naves espaciais.
Como o longa revela, a máquina não fez os cálculos corretos para a missão da sonda Friendship 7, que tinha como objetivo levar o astronauta americano John Glenn a uma viagem ao redor da órbita da Terra.
Antes do lançamento, porém, Glenn pediu para a matemática Katherine Johnson, interpretada pela atriz Taraji P. Henson, refazer os cálculos – o que resultou no sucesso da missão.
Thiago Rotta conta que a falha do IBM 7090 está relacionada com o fato de que sistemas programáveis tem grandes chances de cair em alguma exceção. “Isso acontece porque o computador irá executar exatamente o que lhe foi designado e, quando deparado com algo diferente, não saberá calcular”, conta.
Essa dificuldade de a máquina “sair da caixinha” está relacionada com o crescimento dos dados não estruturados. Dados não estruturados não podem ser interpretados em toda a sua amplitude. Em vídeos, áudios e até em redes sociais, por exemplo, é inviável classificar cada palavra de texto e relacioná-la com pessoas e contextos.
Frente a esse problema, os cientistas começaram a desenvolver os sistemas cognitivos no início do século XXI. “Esses sistemas são programados para pensarem como humanos, a partir da identificação por padrão”, explica Rotta. “Você treina o computador com uma grande quantidade de dados para que ele possa interpretar o que há por trás dos dados não estruturados”, adiciona.
Machine learning e inteligência artificial
É a partir dessa necessidade de criar computadores mais inteligentes que surgem outros termos, tão comuns atualmente, como machine learning e inteligência artificial. No entanto, se engana quem acha que essas palavras são sinônimas.
“Numa simplificação rápida, inteligência artificial busca reproduzir numa máquina a inteligência típica dos seres humanos. Isso envolve aprendizagem, claro”, explica Lisandro Zambenedetti Granville, presidente da Sociedade Brasileira da Computação (SBC), em entrevista a EXAME.com. “Porém, existem atividades que máquinas executam de forma mais eficiente que humanos”, adiciona.
Segundo Granville, uma máquina que rode os algoritmos adequados possivelmente irá trabalhar de maneira mais rápida do que a mente humana. Entretanto, ele duvida que o machine learning seja a única tecnologia que um computador precisa para ser inteligente.
“Entendo que aprendizagem de máquina é um potencial habilitador de inteligência artificial, mas não suficiente”, diz o presidente da SBC. “De outra forma, parece ser improvável que se chegue a um sistema de inteligência artificial real sem a capacidade de aprendizagem.”
Bianca Zadrozny, pesquisadora e gerente de recursos naturais da IBM, tem uma visão similar à de Granville. Para ela, é impossível realizar muitas das coisas relacionadas à computação sem o machine learning. A pesquisadora, porém, ressalta que a ciência está chegando no limite do que o machine learning pode fazer pela inteligência artificial.
E agora?
Se estamos chegando ao limite do machine learning, qual é o próximo passo da inteligência artificial e, consequentemente, da computação?
Para Granville, a computação pessoal não será mais facilmente notada e estará ao redor das pessoas. “Penso que isso evoluirá tanto para os aparelhos dispostos no nosso ambiente doméstico, com a internet das coisas, quanto nos ambientes mais coletivos, deixando as cidades mais inteligentes.”
Thiago Rotta, líder de soluções para IBM Watson, também pensa que o futuro da computação está relacionado com dispositivos móveis que tornam o ambiente em que a pessoa está mais inteligente. “Com esses aparelhos, o indivíduo irá saber se tem alguém em casa, se tem alguma luz ou porta aberta.”
Além disso, para Rotta, os próximos passos da computação pessoal estão ligados à emoção. “A máquina ou o sistema saberá identificar qual é o estado emocional da pessoa para que algo seja feito por ela naquele momento”, explica.
Ele ainda aponta que os algoritmos ficarão mais autônomos e saberão escolher o que é relevante para cada usuário. Zadrozny acredita que, por isso, cada aparelho se tornará ainda mais pessoal. “Cada profissional, por exemplo, terá o gadget mais especializado para seu trabalho ou cotidiano.”
Granville vai um pouco mais além e acredita que a computação pessoal irá extrapolar os dispositivos móveis e poderá gradativamente ser fundida ao nosso organismo. “Imaginando um cenário a mais longo prazo, eu não ficaria surpreso em adquirimos a capacidade, por exemplo, de ‘tuitarmos nossos pensamentos’, literalmente.”