Desde 1999, todas as eleições para a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de Mato Grosso foram decididas pela compra dos votos de deputados, cujos valores variaram de R$ 100 mil a R$ 250 mil por voto.
A afirmação é do ex-governador Silval Barbosa (PMDB), em sua delação à Procuradoria Geral da República (PGR), homologada pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 9 de agosto.
Em seu depoimento, o peemedebista detalhou quem foram os beneficiados e como ocorriam as fraudes nas eleições para o comando do Legislativo que, segundo ele, eram “praxe” no órgão.
“Não me recordo de nenhuma eleição para a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do ano de 1999 até os dias atuais que não tenha sido realizada mediante o pagamento de propinas”.
Silval disse que, em 2003, quando José Riva se elegeu presidente da Assembleia e ele primeiro secretário, a eleição foi realizada “mediante o pagamento de propinas para os demais deputados”.
“Com o recebimento de recursos para votarem nos candidatos indicados para ocupar a Mesa Diretora no ano de 2003, os deputados estaduais se utilizaram desses recursos ilícitos para os pagamentos das dívidas de campanha até então pendentes”.
De acordo com Silval, para comprar o apoio foi pago um valor aproximado de R$ 150 mil por parlamentar.
“Tenho certeza que receberam tais valores de propina para o apoio à Mesa Diretora de 2003 os deputados estaduais do biênio de 2003/2004 a seguir relacionados: Campos Neto (PFL), Carlos Brito (PSDB), Chico Daltro (PDT), Dilceu Antonio Dal Bosco (PSDB), Eliene José de Lima (PSB), Hermínio José Barreto (PR), João Antônio Cuiabano Malheiros (PR), Mauro Luiz Savi (PSB), Pedro Satélite (PSDB), Sebastião Rezende (PSC), Sérgio Ricardo de Almeida(PR), Joaquim Sucena (PFL), Carlão (PSDB), Alencar Soares (PSDB) e José Carlos de Freitas (PPB)”.
“Para alguns deputados foram pagas as despesas remanescentes da campanha eleitoral de 2002, para outros as propinas foram pagas em espécie, e para alguns, foram pagas despesas de campanhas e valores em espécie, mas todos os nomes anteriormente citados receberam vantagens indevidas pela eleição da Mesa Diretora no ano de 2003”.
Para pagar tal propina, segundo Silval, ele e José Riva fizeram um empréstimo no valor aproximado de R$ 2 milhões com Valcir Piran (já falecido), irmão do empresário Valdir Piran, do ramo de factoring.
O empréstimo teria sido quitado com o “retorno” de 15% a 25% do valor pago pela Assembleia para empresas prestadoras de serviços.
“Me recordo que no momento em que contraímos a dívida, eu e José Riva nos reunimos com o então Governador do Estado de Mato Grosso Blairo Borges Maggi, atualmente ministro da Agricultura, com o fim de obter recursos para o pagamento da dívida assumida pela eleição da Mesa Diretora em face dos Deputados Estaduais.Nessa conversa Blairo Maggi disse que não concordava pagar em dinheiro e que aceitaria desde que fosse dentro do orçamento da ALMT e que estaria disposto a suplementar o orçamento”.
“Blairo Maggi concordou com a suplementação e em troca a Mesa Diretora, composta por mim e José Riva, apoiaria o governo de Blairo Maggi. Blairo Maggi aceitou suplementar o orçamento da Assembleia Legislativa sabendo que tais recursos seriam utilizados para a obtenção dos retornos necessários para o pagamento das propinas aos deputados estaduais”.
A suplementação, conforme o ex-governador, foi executada pelo então secretário de Fazenda Waldir Teis, atual conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT). Além da compra da mesa, o acréscimo também teria sido usado para pagar o “mensalinho” aos parlamentares.
“Waldir Teis também tinha ciência de que parte dos recursos públicos destinados à suplementação seriam utilizados para os desvios”.
Mais compras
A mesma sistemática teria ocorrido na eleição da Mesa Diretora do biênio 2005/2006, que foi realizada no dia 30/09/2004. Nessa eleição, Silva conseguiu a presidência e Riva a 1ª secretaria.
Porém, o valor de cada voto aumentou: entre R$ 200 mil a R$ 250 mil.
“Receberam as propinas os seguintes deputados estaduais: Humberto Bosaipo, Campos Neto (PFL), Carlos Brito (PSDB), Chico Daltro (PDT), Dilceu Antonio Dal Bosco (PSDB), Eliene José de Lima (PSB), Hermínio José Barreto (PR), João Antônio Cuiabano Malheiros (PR), Mauro Luiz Savi (PSB), Pedro Satélite (PSDB), Sebastião Rezende (PSC), Sérgio Ricardo de Almeida(PR), Joaquim Sucena (PFL), Carlão (PSDB), Alencar Soares (PSDB) e José Carlos de Freitas (PPB)”.
Desta vez, conforme o relato de Silval, o empréstimo para pagar os votos foi feito com o próprio Valdir Piran, em valor aproximado de R$ 3 milhões.
“A quitação do empréstimo foi executada através de retornos recebidos pela Mesa Diretora da Assembleia Legislativa em face de serviços executàdos na casa parlamentar”.
Silval também completou que as eleições das mesas de 2007/2008 e 2009/2010 foram igualmente compradas, assim como as de 2011/2012 e 2013/2014, ocorridas quando ele era governador.
“Tenho conhecimento que em todas as Mesas Diretoras constituídas na Assembleia Legislativa, enquanto fui parlamentar, foram realizadas mediante o pagamento de vantagem indevida, sendo que eu me recordo de ter recebido propinas nas eleições das Mesas Diretoras em que não participei, nos anos de 1999/2003, porém não me recordo o quanto”.
“Sempre foi assim”
O ex-governador relatou que o sistema de eleição da Mesa funcionava da seguinte maneira: no momento em que uma nova Mesa era eleita, o presidente e o primeiro secretário recém-empossados assumiam as dívidas da mesa.
“Geralmente, o passivo da Mesa é oriundo do pagamento de vantagens indevidas que a Mesa Diretora faz em favor dos demais deputados estaduais, em troca do apoio para aprovação dos projetos do Governo (governabilidade)”.
“Esses pagamentos eram conhecidos pelos parlamentares como ‘mensalinho’. O ‘mensalinho’ funcionava também como um "cala boca" da Mesa Diretora em face dos demais deputados para evitar que denunciassem as fraudes e desvios que aconteciam na ALMT e no Governo”.
“Assim eram compostas as Mesas Diretoras, o sistema é esse e sempre foi assim, sendo que tal fato ocorreu desde a sua primeira legislatura como deputado estadual no ano 1999/2002”.
Veja o fac-símile de trecho da delação: