O sábado (25) ia tranquilo até as 18h30, quando uma denúncia da influenciadora digital Paula Holanda fez tremer o solo de todo ativismo militante da esquerda (confira aqui).
Sua denúncia expôs um esquema anti-ético pelo aspecto pessoal e criminoso pelo aspecto jurídico, de contratação para propaganda eleitoral que envolve um grande número de influenciadores digitais.
Explico a falha ética – de caráter mesmo, dos envolvidos – e o aspecto legal no final do texto. Vamos agora entender o que se passou.
Nas palavras da própria Paula Holanda:
“muitos ativistas das redes estão participando dessa ação no twitter, a proposta era criar um tweet por dia, se alinhado à uma pauta específica que nos enviavam por e-mail”
Tal esquema tem a Agência Lajoy como principal responsável.
Confira a sequência de tweets na íntegra:
“Tenho algo muito importante para falar. quero deixar claro que vou expor essa situação depois de muita tentativa de diálogo, o que não aconteceu.
E dizer que desprezo tudo o que está envolvido com a direita brasileira, antes que organizações partidárias usem isso ao seu favor.
Quem me segue aqui sabe que não sou e nem nunca fui partidária. Eu sou antifascista, defensora dos direitos humanos e das liberdades individuais.
Não tenho meu pensamento engessado por partidos e ideologias. Posso não ser a pessoa mais coerente, mas sou coerente ao que acredito.
Eu nunca na vida fui paga para produzir conteúdo nas minhas redes sociais pessoais. eu nunca trabalhei como “influencer” e nem nunca fiz questão. Há três dias, recebi a minha primeira proposta.
Pensei “ok, legal, eu acredito na esquerda e nos direitos humanos, então por quê não?”
Muitos ativistas das redes estão participando dessa ação. No twitter, a proposta era criar um tweet por dia, se alinhado à uma pauta específica que nos enviavam por e-mail.
Reforçando que o que nos foi passado é que seria uma campanha de esquerda, e não uma campanha partidária.
Reforçando aqui também que a isabella, que me passou o e-mail da proposta, não está envolvida diretamente com o caso.
Ela só estava ali como contratada, assim como eu. a principal envolvida é a agência lajoy.
A primeira pauta foi sobre a Gleisi Hoffman. acompanhei o caso da gleisi e ele ilustra bem a perseguição partidária, bem como a prisão do lula, que foi sim de cunho político.
Me pareceu uma pauta muito justa, então eu fiz o tweet sem resistência.
A segunda pauta foi sobre o Luiz Marinho. Parte da minha família mora em são paulo e eu viajo com certa frequência para lá, então a agenda paulista me interessa.
Eu conheço o plano do marinho e sou anti-dória desde sua gestão como prefeito. twittei.
Eu comecei a ficar desconfiada pois as duas primeiras pautas eram sobre petistas.
Minha desconfiança explodiu hoje, na terceira pauta, sobre o governador petista do piauí Wellington Dias.
O combinado foi manter sigilo sobre a ação. mas o combinado também foi que a ação seria de esquerda, não uma ação partidária.
Então eu posso falar sobre toda a situação aqui, até porque eu não assinei nenhum contrato. repito que não foi por falta de tentativa de diálogo.
Eu me recusei a twittar sobre o Wellington Dias. Não tenho nenhuma ligação com o piauí e não o conheço.
Pesquisei rapidamente e pela opinião pública da esquerda, e ele aparentemente não foi um bom governador. Li que ele sucateou e militarizou a educação e silenciou mulheres.
Eu tenho meus princípios. Eu nunca vou falar sobre o que eu não acredito.
Eu nunca vou aceitar receber dinheiro para fazer ou opinar algo que não acredito. Quem me segue aqui e me conhece sabe que nem sempre tomo as melhores atitudes, mas sou fiel aos meus posicionamentos.
Foi a terceira pauta sobre um político petista e já nos encaminharam uma quarta, também sobre um político petista.
Algumas pessoas da equipe começaram a ficar incomodadas sobre a ação (mais por conta de “haters” de direta) e eu trouxe isso à tona para o grupo.
O que me deixou verdadeiramente irritada, além de um descumprimento com a proposta (ser de esquerda, e não necessariamente partidária) foi o silenciamento. Fui expulsa do grupo da ação por me posicionar — e eu me posicionei educadamente, a fim de promover diálogo e discussão.
Eles disseram que o grupo seria restrito para discutir as pautas, e que não faria sentido eu continuar nele se “eu não queria continuar na ação”.
Mas em momento nenhum pedi para sair. Em momento nenhum eles me perguntaram se eu queria continuar. queria dialogar e fui silenciada.
Uma das responsáveis pela ação, que foi também a responsável pela minha remoção do grupo, veio falar comigo no privado.
Ela tentou me convencer que não foi silenciamento, mas tipo assim, eu não sou burra. só um adendo, tudo o que estou dizendo é ponto de vista. Segue o diálogo.
Eu pedi para sair principalmente porque, repito, não sou partidária. Sou apegada aos meus valores, à ética.
O silenciamento só reforçou que essa ação fedia. não quero defender candidatos petistas cegamente, até porque tenho muitas divergências quanto ao governo de rui costa na Bahia.
Repetindo aqui. a thread não é contra a esquerda. não é contra governos petistas. Lula é o melhor presidente que o brasil já teve e vou votar nele, apesar de ter minhas ressalvas.
A thread é contra a falta de honestidade de agências de comunicação e de influenciadores digitais”
Influenciadores digitais
Após a denúncia da moça, ao pesquisarmos o nome do político Wellington Dias no Twitter, imediatamente apareceram diversas publicações no topo dos ‘Tweets populares’ — todos eles formados por influenciadores digitais.
A estratégia foi muito bem elaborada, não restam dúvidas. As publicações enalteciam o governador do Piauí de uma forma diferente, o que para o público leigo faz parecer de fato um ato espontâneo do twitteiro que segue e não um serviço contratado por um partido.
O mais incrível é que nenhum dos influenciadores conhece o político Wellington Dias, muitos menos a rejeição que o candidato tem na região que estavam levantando bandeira.
O site da Agência Lajoy, misteriosamente, saiu do ar no domingo.
Análise do caso
Ao difundir uma ação de rede coordenada do PT, para promover candidatos como Wellington Dias, do Piauí — a thread de Paula Holanda começou citando Gleisi Hoffmann, do Paraná, e Luiz Marinho, de São Paulo. A moça ainda afirmou que existe um quarto petista na fila. Além de algo grave, a publicação revela que não é uma ala isolada do PT do Piauí. É um envolvimento com toda cúpula do PT nacional.
Outro ponto a ser questionado com bastante cautela: O dinheiro pago para essas ‘ações’ estava declarado ou era caixa dois?
Segundo hipótese levantada pelo site Conexão Política: “se a origem do dinheiro for ilícita, toda essa operação de contratos seria lavagem de dinheiro“.
Consultando por indicação de um especialista a Resolução 23.551/2017 do TSE, encontrei o seguinte texto no Artigo 24: “vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, coligações e candidatos e seus representantes”.
Esta resolução (23.551/2017) trata da propaganda eleitoral, da utilização e geração do horário gratuito e das condutas ilícitas durante campanha eleitoral. Em outras palavras, é crime sim e a pena é cassação do mandato por abuso de poder econômico.
Como disse no começo do texto, os twitteiros que participaram desta ação comportaram-se como anti-éticos e criminosos.
Anti-éticos porque os seguidores que depositaram neles suas confianças esperavam comportamento espontâneo, não um serviço publicitário partidário, remunerado e ainda por cima criminoso.
Criminoso porque ter plena consciência do que fazem é um dever, sobretudo tratando-se de política, terreno no qual decidem-se as leis do país, e neste caso praticaram propaganda política ilegal.
Ainda com relação aos twitteiros, por outro lado seria cômico se não fosse trágico: este é um exemplo pungente do significado de “idiota útil“.
Nem penso mais em punição dos culpados isoladamente, a pergunta que não me sai da cabeça hoje é a seguinte:
Por que razão o PT ainda não teve sua sigla cassada?!