O Ministério Público Estadual (MPE) emitiu parecer em que pede ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) que revogue a decisão do desembargador Pedro Sakamoto e mantenha a juíza Selma Arruda na condução da ação penal em que é réu o ex-secretário de Administração, Francisco Faiad.
A ação penal apenas no que tange a Faiad foi suspensa pelo magistrado, de forma liminar (provisória), no último dia 15, em razão de uma possível suspeição de Selma para atuar no caso.
Caberá agora a Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJ-MT decidir se mantém ou não a juíza afastada da ação contra Faiad, derivada da 5ª fase da Operação Sodoma.
Na ação, Faiad é acusado de ter integrado um suposto esquema que teria causado prejuízo de R$ 8,1 milhões aos cofres do Estado, entre 2011 e 2014, por meio da exigência de propina dos sócios do Auto Posto Marmeleiro e da Saga Comércio e Serviço de Tecnologia e Informática Ltda., Juliano Volpato e Edézio Corrêa.
Em troca, os empresários eram favorecidos em contratos com o Estado, cujas licitações eram fraudadas e os valores pagos eram superfaturados em favor das empresas.
Parte do dinheiro teria sido usada para quitar dívidas de campanha de 2012 do então candidato a prefeito de Cuiabá, Lúdio Cabral (PT), e do próprio Faiad, que era vice do petista na ocasião.
Faiad chegou a ser preso por decisão de Selma Arruda, em fevereiro deste ano, durante a operação, mas foi solto dias depois.
No parecer, o MPE afirmou que Faiad não apontou fato novo, além dos já indicados na exceção de suspeição, "que indique risco concreto na demora do julgamento do incidente de exceção pelo Tribunal de Justiça".
Desta forma, segundo o órgão, não há motivos para manter a ação suspensa enquanto não for julgada a exceção de suspeição que visa afastar Selma Arruda do caso. Para o Ministério Público, a ação de Faiad é "descabida".
"O MPE ressalta que o Código de Processo Penal não admite, em regra, a suspensão da ação penal por oposição de exceção, impondo o seu andamento normal, portanto, a designação de audiência de instrução e julgamento não passa do estrito cumprimento do dispositivo legal", diz trecho do pedido.
Entenda o caso
Em 1ª Instância, Faiad havia ingressado com uma exceção de suspeição contra a juíza, sob a alegação de que sua prisão foi decretada com base em argumentos "esdrúxulos e claramente ofensivos à classe da advocacia".
Outro argumento contra Selma são as entrevistas dadas pela magistrada que, conforme Faiad, demonstraram que a juíza não atuaria com imparcialidade e teria “ânsia” em condená-lo.
A reclamação também aponta que a magistrada se utilizaria das ações judiciais contra corruptos para ganhar visibilidade e fomentar uma eventual carreira política.
Faiad ainda acusou Selma de ter “ânsia em condenar”, com o objetivo de alavancar uma futura carreira na política, e citou que as reclamações feitas contra ela no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tirariam da juíza a isenção para julgá-lo.
Como a juíza não se declarou suspeita, o ex-secretário então ingressou com um mandado de segurança no Tribunal de Justiça. Faiad reclamou que a juíza deveria ao menos ter suspendido a ação penal até que a 2ª Câmara analisasse se ela era ou não suspeita para julgá-lo.
Acusações "preocupantes"
Pedro Sakamoto explicou que, em regra, a análise pendente de exceção de suspeição no Tribunal não suspende o andamento da ação penal, a não ser em casos excepcionais.
O magistrado destacou que um dos pedidos de providências de Faiad contra Selma, feito na época em que ele presidiu a OAB-MT, em 2008, tratava de suposto nepotismo no gabinete da magistrada, "que mantinha na lotação seu esposo, o Sr. Norberto Arruda". Sakamoto relatou que o pedido de Faiad foi acolhido pelo conselheiro Joaquim Falcão, que determinou que Selma não mantivesse mais seu esposo na vara, ainda que o trabalho dele fosse voluntário.
"Indisfarçavelmente, tal decisão causou aborrecimento à impetrada, uma vez que redundou no afastamento de seu marido das funções que irregularmente exercia em seu gabinete", disse Sakamoto.
Além disso, Sakamoto citou que Faiad ingressou com uma reclamação disciplinar contra a juíza após ser preso, apontando sete desvios de conduta, fato que motivou o corregedor nacional de Justiça, ministro João Noronha, a encaminhar o caso à Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Mato Grosso para que apurasse os fatos narrados, "o que acarretou na instauração, por este órgão, de sindicância em face da Dra. Selma Rosane Santos Arruda".
Desta forma, conforme Sakamoto, não é possível negar que as acusações feitas por Faiad contra Selma "são preocupantes e, se procedentes, poderão ensejar punições à eminente julgadora".
"Portanto, o cenário que se desenha, como resultado das apontadas provocações ao CNJ, é de provável indisposição da autoridade apontada como coatora para com o impetrante, circunstância apta a colocar em xeque a capacidade da magistrada para franquear a Francisco Anis Faiad um julgamento imparcial".
Com base na plausibilidade dos argumentos e na possível nulidade dos atos da juíza caso a suspeição seja julgada procedente, o desembargador entendeu ser melhor suspender o processo até que a câmara decida a questão.
"Ex positis, com fulcro no art. 7º, inciso III, da Lei n. 12.016/2009, defiro em parte a liminar vindicada, tão somente para que a Ação Penal n. 233830-44.2013.8.11.0042 seja sobrestada em relação a Francisco Anis Faiad até que o relator da Exceção de Suspeição n. 15885-52.2017.8.11.0042 neste Tribunal se pronuncie sobre os efeitos em que recebe o incidente, ou, à míngua dessa manifestação, até decisão final do órgão colegiado competente, sem prejuízo de desmembramento do processo de origem", decidiu.
Acusado em esquema
O Ministério Público apontou que a participação de Francisco Faiad nesse esquema estaria ligada ao pagamento de dívida de R$ 1,7 milhão contraída com a Marmeleiro Auto Posto durante a campanha de 2012, quando foi candidato a vice-prefeito ao lado de Lúdio Cabral (PT) à Prefeitura de Cuiabá.
Após a derrota na campanha, Faiad foi nomeado para a Secretária de Administração, onde permaneceu de janeiro a dezembro de 2013. Para o MPE, sua missão alí seria garantir a continuidade da arrecadação de propina para a organização criminosa, através do "mecanismo fraudulento da Secretaria de Transportes" .
A acusação ainda descreve que, entre fevereiro e agosto, o advogado teria desviado o suficiente para a quitação de sua dívida e que de setembro a novembro teria desviado mais R$ 916 mil, "dinheiro que foi destinado a formação de caixa 2 da futura campanha eleitoral do grupo político de Silval Barbosa no ano de 2014".
Além disso, um dos delatores, o empresário Edézio Corrêa, afirmou que Faiad fazia parte de um esquema de "mensalinho" da organização criminosa, junto do ex-governador Silval Barbosa, o ex-secretário de Estado de Silval, César Zilio e o empresário Juliano César Volpato. Nesse esquema, Faid teria acumulado R$ 192 mil.
Sodoma 5
De acordo com a denúncia do Ministério Público Estadual, do total de R$ 8,1 milhões supostamente desviados do Governo, R$ 3,05 milhões corresponderam a propina paga, entre outubro de 2011 e dezembro de 2014, pela empresa Marmeleiro Auto Posto Ltda; e R$ 5,1 milhões correspondem a de inserções fictícias de consumo de combustível num sistema de controle de uso de combustível que era gerido pela empresa Saga Comércio e Serviço Tecnologia e Informática Ltda.
Ainda segundo o MPE, em troca do pagamento da propina, as empresas conseguiram a permanência como fornecedoras de combustível para toda a frota do Poder Executivo. Para isso, três pregões presenciais teriam sido fraudados. O lucro das duas juntas teria sido de aproximadamente R$ 300 milhões.
Neste contexto, Faiad seria o responsável pelo pagamento de uma dívida de R$ 1,7 milhão contraída com a Marmeleiro Auto Posto durante a campanha de 2012, quando foi candidato a vice-prefeito de Cuiabá na chapa de Lúdio Cabral (PT).
Após a derrota na eleição, o advogado foi nomeado secretário de Administração, cargo que ocupou até dezembro de 2013. Para o MPE, sua missão seria garantir a continuidade da arrecadação de propina para a organização criminosa, através do "mecanismo fraudulento da Secretaria de Transportes".
Além de Faiad, são réus da ação penal o ex-governador Silval Barbosa (PMDB); os ex-secretários de Estado Cesar Zílio e Pedro Elias; o ex-chefe de gabinete de Silval, Silvio Cesar Corrêa Araújo; o ex-secretário adjunto de Administração, José de Jesus Nunes Cordeiro; o ex-secretário adjunto da Secretaria de Transportes, Valdísio Juliano Viriato; os empresários Juliano Cezar Volpato e Edézio Corrêa; e os ex-servidores da Secretaria de Transportes, Alaor Alves Zeferino de Paula e Diego Pereira Marconi.