O desembargador Pedro Sakamoto, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, negou o habeas corpus que pedia a soltura do ex-secretário de Administração do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), Marcos José da Silva, apontado como líder do esquema investigado na Operação Convescote.
A decisão, em caráter liminar (provisório), foi dada nesta quinta-feira (20).
A operação apura suposto desvio de mais de R$ 3 milhões dos cofres públicos, por meio de convênios firmados entre a Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual (Faespe) e a Assembleia, TCE, Secretaria de Estado de Infraestrutura e Prefeitura de Rondonópolis, entre 2015 e 2017. A fundação, segundo a denúncia, criava “empresas fantasmas” para simular a prestação de serviços.
Marcos José da Silva, que é técnico do controle externo efetivo do TCE, e sua esposa Jocilene Assunção - diretora da Faespe - foram presos na 1ª fase da operação, deflagrada em 20 de junho. Porém, Jocilene foi colocada em prisão domiciliar para cuidar do filho pequeno.
De acordo com o Gaeco, junto com a esposa, Marcos José era o líder da organização criminosa e cumulava suas funções no TCE com o controle das contratações das empresas “fantasmas” que simulavam prestar serviços para receber o dinheiro do convênio.
Conforme o Gaeco, o ex-secretário do TCE tinha o papel de fiscalizar de administrar o convênio entre a Faespe e o TCE e, ao mesmo tempo, escolhia quais empresas fictícias prestariam os serviços, “além de atestar falsamente a prestação de muitos ‘serviços’, sendo ele e sua convivente [Jocilene Assução] os destinatários da maior parte dos recursos escusos”.
No habeas corpus, a defesa de Marcos disse que a juíza Selma Arruda fundamentou a prisão do servidor com base "na suposta periculosidade do grupo criminoso ou de terceiros e não na sua própria conduta".
Outro argumento é que existiriam contra o servidor apenas "presunções" com base no resultado de interceptações sem qualquer conteúdo ilícito "e dados bancários que não demonstram a prática de nenhum delito, tanto que na 'denúncia' anônima que deu base para a operação o seu nome nem sequer teria sido citado"
O magistrado não acatou os argumentos da defesa. "Observo que o Juízo de primeira instância decretou a custódia cautelar do paciente por visualizar prova da materialidade e indícios suficientes de autoria dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e constituição de organização criminosa, ponderando as circunstâncias do caso", escreveu Sakamoto em sua decisão.
"Com efeito, tem-se que os elementos de prova indicados pela magistrada singular, ao menos por ora, revelam-se aptos a demonstrar a probabilidade de autoria exigida para a decretação da prisão preventiva", escreveu.
Sakamoto também rechaçou a tese de que não haveria mais riscos de ocorrência de novos crimes.
"Quanto às alegações de que os contratos da Faespe com o Tribunal de Contas e a Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso tenham sido suspensos, bem como tenha o paciente sido exonerado da função de confiança exercida no TCE, fatos que impediriam a prática de novos delitos, entendo não ser determinantes para a concessão da liminar", continuou o desembargador. "Pois ao que tudo indica ainda existem contratos da Faespe com outros órgão públicos, bem como o paciente ainda mantém o cargo efetivo no TCE, fatos que demanda melhor análise quando do julgamento do mérito do presente habeas corpus".
Operação Convescote
Conforme a denúncia, o grupo composto pelos réus Claúdio Roberto Borges Sassioto, Marcos Moreno Miranda, Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira, José Carias da Silva Neto, Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira, João Paulo Silva Queiroz, Jose Antonio Pita Sassioto, Hallan Gonçalves de Freitas, Marcos José da Silva, Jocilene Rodrigues de Assunção, Marcos Antonio de Souza e Elizabeth Aparecida Ugolini teria constituído uma organização criminosa “estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas”.
A organização teria o intuito de se apropriar ilicitamente de recursos públicos da Assembleia e do TCE, “bem como que, em continuidade delitiva, ocultaram e dissimularam a natureza, origem e propriedade dos valores provenientes de infração penal (lavagem de capitais)”.
Para tal, eles teriam cooptado e/ou criado empresas fantasmas para celebrarem contratos fictícios de prestação de serviços com a administração púbica, e, com isso, ilicitamente desviaram recursos por meio da Faespe.
O MPE apontou como líder do esquema Marcos José da Silva que, à época, ocupava a função de Secretário Executivo de Administração do TCE e tinha sob o seu comando o Núcleo de Gestão de Contratos, Convênios e Parcerias, que é o setor responsável pela administração de todos os convênios, contratos e instrumentos congêneres.
Segundo o MPE, em virtude do cargo, o Marcos José detinha o poder/dever de fiscalizar e administrar o convênio firmado entre a Faespe e o TCE, “fato que lhe permitia escolher e determinar quais ‘empresas fantasmas’ prestariam serviços fictícios para o órgão”.
As empresas usadas para o esquema pertenciam a Marcos Moreno Miranda, João Paulo da Silva Queiroz, Hallan Gonçalves de Freitas, Jocilene Assunção (esposa de Marcos José e diretora da Faespe), Karinny Oliveira, Luiz Benvenuti, José Carias Neto (irmão de Marcos José) e Antonio Pita Sassioto.
“As referidas empresas, além de não possuírem nenhum empregado, tinham como única fonte de receita o convênio/contrato com a Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual (Faespe) excetuando-se, nesse pormenor, as empresas H. G. de FreitasS – ME e Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira – ME, que receberam, também, dinheiro de outras fontes, como Associação Plante Vida e F.B. de Freitas”.
A denúncia narra que de 2015 a 2017 os denunciados desviaram R$ 3 milhões dos cofres públicos por meio do esquema.
“Os denunciados, mediante conta pessoa física e/ou pessoa jurídica, receberam vultosos recursos públicos “intermediados” pela Faespe e, em seguida, fizeram saques na boca do caixa e/ou transferiram/depositaram boa parte dos valores em favor do denunciado Cláudio Roberto Borges Sassioto [servidor do TCE], pessoa que também é apontada como um dos aliciadores de “empresas fantasmas” para o esquema criminoso, bem como dos denunciados Marcos José da Silva e Jocilene Rodrigues de Assunção”.
Já a denunciada Elizabeth Ugolini seria o braço da organização criminosa dentro da instituição bancária Sicoob, “possibilitando que a movimentação das contas correntes dos empresários denunciados fosse feita pelos demais membros do grupo, especialmente pelo servidor do TCE e também denunciado, Claudio Roberto Borges Sassioto”.
“O Ministério Público narra, também, que as empresas envolvidas no esquema delituoso possuíam o mesmo escritório de contabilidade, Euro Serviços Contábeis, cujo sócio é o denunciado Marcos Antonio de Souza, pessoa que detinha procuração para administrar a empresa F P da Costa EPP, que atua em serviços combinados de escritório e apoio administrativo, pessoa jurídica que também recebeu recursos do Convênio Faespe/ALMT, conforme notas fiscais juntadas aos autos”.
Segundo o MPE, o próprio Marcos Antonio confessou que emitiu notas fiscais superfaturadas pelas empresas Euro Serviços Contábeis F P da Costa EPP, “destacando que sacava os valores na boca do caixa e entregava parte dos recursos para Jocilene Rodrigues de Assunção”.
A denúncia ainda afirma que o ex-secretário geral da Assembleia Legislativa, Tschales Tschá, e os assessores do deputado Guilherme Maluf (PSDB), Sued Luz e Odenil Almeida, “atestaram a prestação dos serviços não efetivamente prestados pelas empresas de “fachada”, fazendo inserir declarações falsas em documentos públicos, com o fim de criar obrigação inexistente e alterar a verdade sobre fatos juridicamente relevantes”.
Além deles, também teriam cometido tais crimes o coronel Nerci Adriano Bernardi (que possui cargo comissionado na AL), Drieli Azeredo Ribas (servidora da AL), Marcio José da Silva e Alison Luis Bernardi (funcionários da Faespe) e Marcelo Catalano Correa (servidor do TCE)
Já o oficial de Justiça Eder Gomes de Moura é acusado de ter oferecido vantagem indevida a uma servidora da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, “para determiná-la a fornecer cópias dos autos de quebra de sigilo bancário relacionada aos fatos objeto da denúncia”.
A servidora recusou a oferta e, com auxílio do Gaeco, conseguiu filmar a proposta indevida.
“Conforme narrado, o referido denunciado em 30/05/2017, teria oferecido à Gestora a quantia de R$ 5 mil. Posteriormente, em 02/06/2017, insistindo no desiderato
criminoso, teria aumentado a oferta para R$ 15 mil e a confirmado em 07/05/2017, numa terceira oportunidade”.
Prisões
Foram alvo de mandados de prisão preventiva: Cláudio Roberto Borges Sassioto, Marcos Moreno Miranda, Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira, José Carias da Silva Neto Neto, Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira (que conseguiu prisão domiciliar), João Paulo Silva Queiroz, José Antônio Pita Sassioto, Hallan Goncalves de Freitas, Marcos José da Silva, Jocilene Rodrigues de Assunção e Eder Gomes de Moura.
Dos presos, sete já conseguiram deixar a cadeia. Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira, Jocilene Rodrigues de Assunção, Marcos Moreno Miranda e José Carias Neto tiveram as prisões preventivas convertidas em domiciliares, por decisão da juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital.
João Paulo Silva Queiroz conseguiu liberdade com tornozeleira eletrônica, também por decisão da magistrada. Luiz Benvenutti foi solto com cautelares mais leves, como a de comparecer mensalmente à Justiça, e Eder Gomes de Moura conseguiu a liberdade sem nenhuma cautelar.