A juíza Célia Vidotti, da Vara de Ação Civil Pública e Ação Popular de Cuiabá, condenou os servidores Leda Regina Rodrigues, Jairo Oliveira, Carlos Marino Silva e Eliete Maria Modesto, da Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz), a ressarcirem R$ 5,1 milhões aos cofres públicos.
A decisão é da última terça-feira (17) e cabe recurso. Também foram condenados os empresários Djalma de Jesus Ferreira e Sônia Regina Ferreira, sócios da empresa Djalma Transportes e Representações Ltda., e os herdeiros do falecido servidor Jorge Maranhão.
O grupo foi condenado por ter montado um esquema para conceder regime especial de ICMS à empresa, em 1997, de forma fraudada e sem o atendimento dos requisitos necessários, no intuito de reduzir a dívida tributária da Djalma Transportes.
Além dos R$ 5,1 milhões, os condenados (com exceção da empresa) ficarão com os direitos políticos suspensos por cinco anos e proibidos de contratar com o Poder Público pelo mesmo período.
Eles também terão que pagar multa civil no valor de R$ 255 mil, cada um, e arcar com as despesas do processo.
De acordo com a ação do Ministério Público Estadual (MPE), os sócios omitiram intencionalmente as prestações interestaduais de serviços de transporte rodoviário de carga e utilização de Conhecimentos de Transporte Rodoviário de Cargas.
Com a fraude, a empresa conseguiu angariar um crédito tributário de ICMS no valor de R$ 5,1 milhões.
“Os servidores fazendários estavam em conluio com os administradores da empresa e, cada um deles, no exercício de suas funções, atuou ou se omitiu de modo a facilitar a concessão do regime especial de recolhimento de ICMS, mesmo sem que a empresa preenchesse os requisitos legais para tal benefício”, disse o MPE.
Djalma e Sônia Ferreira, segundo a acusação, ainda usaram documento falso para emitri conhecimentos de Transporte Rodoviário de cargas em duplicidade, “fazendo com que o valor do ICMS devido fosse artificialmente reduzido”.
“A conduta dos requeridos causou danos morais ao ente público Estado de Mato Grosso, uma vez que os atos supostamente praticados pelos requeridos são flagrantemente contrários aos princípios constitucionais vigentes, abalando moralmente toda a sociedade mato-grossense, que se sentiu ultrajada pala malversação do dinheiro público”.
Em suas defesas, parte dos servidores alegou ter fiscalizado adequadamente os procedimentos e que não eram responsáveis pela concessão do regime especial do ICMS.
Já os servidores responsáveis pela concessão afirmaram que suas decisões foram regulares e baseadas nos documentos que estavam no procedimento, uma vez que não sabiam da falsificação.
Os empresários Djalma e Sônia Ferreira também argumentaram que apenas apresentaram os documentos necessários para obter o regime especial, tendo o requerimento sido atendido pela Sefaz.
Concessão sem fundamentação
Ao condenar os réus, a juíza Célia Vidotti citou o depoimento do contador Pedro Gomes de Lima, que disse ter sido procurado por Djalma Ferreira.
“O Djalma me procurou para fazer o serviço dele de contabilidade. Aí surgiu todo mundo fazendo Regime Especial (...), e ele solicitou para mim. Eu falei para ele que não tinha condições, a empresa dele não tinha a documentação legal para entrar com o pedido. Ele não gostou, levou a documentação embora do escritório e pegou alguém que fez para ele, não sei qual contador”, diz trecho do depoimento.
Mesmo não preenchendo os requisitos, Djalma protocolou o requerimento, que teve parecer favorável do servidor Jairo Carlos Oliveira.
Segundo a juíza, as irregularidades chegaram a ser constatadas por outra servidora da Sefaz, mas o processo foi enviado ao servidor Carlos Marino, que teve opinião semelhante a de Jairo.
“Em seguida, o processo foi enviado à requerida Leda Regina de Moraes Rodrigues, para decisão. Nessa oportunidade, o pedido de concessão do Regime Especial foi deferido por 20 dias, determinando-se a intimação da empresa para providenciar a garantia hipotecaria (fls. 100). É possível observar que a requerida Leda Regina de Moraes Rodrigues não fundamentou, ainda que minimamente, a sua decisão, a qual não encontra respaldo em nenhum dos artigos da Portaria 09/97, ou seja, a referida normativa não traz a possibilidade de concessão provisória do regime, para que então, posteriormente, a empresa providencie a documentação necessária”.
Para a magistrada, o argumento do servidores de que não eram responsáveis pela análise da garantia apresentada não se sustenta, “pois a servidora Mailsa de Jesus, lotada na mesma gerência que os requeridos Jairo, Carlos Marino e Eliete, fez consignar em seu parecer lançado no processo, a irregularidade da garantia ofertada pela empresa, para obter o regime especial e, posteriormente, obter a renovação”.
“Ainda que não coubesse aos requeridos Jairo, Carlos Marino e Eliete o deferimento ou a rejeição do pedido de regime especial, não há dúvida que eram eles os responsáveis em averiguar se os documentos apresentados pelos interessados eram hábeis e suficientes, para atender aos requisitos da Portaria 09/97”.
“Os requeridos Jairo, Carlos Marino, Eliete e Leda ignoraram o alerta feito pela servidora Mailsa sobre a irregularidade dos documentos e, desta forma, cada um, no exercício de suas atribuições, contribuíram para que o regime especial para o recolhimento do ICMS fosse concedido à empresa requerida de forma irregular, pois deixaram de observar o que prescrevia a Portaria pertinente a matéria”.
Outros servidores ouvidos pela Justiça confirmaram que os réus eram responsáveis por analisar a documentação necessária para a concessão do regime especial.
“Nesse passo, verifica-se que a conduta dos requeridos servidores fazendários, se voltaram no sentido de conceder, a qualquer custo, o Regime Especial para a empresa requerida, dispensando, sem motivação, o preenchimento de todos os requisitos previstos na Portaria 09/97. Assim agindo, sem observar a normativa aplicável, os requeridos violaram os princípios administrativos da legalidade, impessoalidade, igualdade, eficiência”.
“Em contrapartida, a empresa requerida foi largamente beneficiada, pois conseguiu o Regime Especial sem preencher os requisitos do 2.º ou, do art. 4.º, da Portaria 09/97, e ainda teve seu patrimônio resguardado contra futuras execuções pelo Estado, já o que o documento apresentado, para fins de garantia, não possuía qualquer validade jurídica”.
Célia Vidotti registrou que a concessão do regime, dada pela servidora Leda Rodrigues, não tinha nenhuma fundamentação.
“Os documentos inidôneos, referentes à garantia mencionada no art. 4º, da Portaria 09/97, também serviram para embasar a renovação do regime especial [...] Assim, na mesma linha de ausência total de fundamentação concreta ou jurídica, ainda que mínima - o que é necessário, ainda que se cuide de ato discricionário - a requerida Leda Regina Moraes Rodrigues deferiu a renovação do benefício à empresa, propiciando-lhe a atuação espúria e a sonegação de impostos, em prejuízo ao erário estadual”.
Desta forma, a juíza concluiu que todos os envolvidos contribuíram para a fraude, que gerou enriquecimento ilícito aos sócios da Djalma Transportes, e decidiu pela condenação dos réus.
“Os requeridos Leda Regina de Moraes Rodrigues, Jairo Calos de Oliveira, Carlos Marina Soares Silva e Eliete Maria Dias Ferreira Modesto, que se manifestaram no processo de concessão do Regime Especial, aceitaram uma garantia absolutamente inidônea, sem qualquer validade jurídica, o que, por consequência, acarretou prejuízo ao erário. O requerido Jorge Damião, com sua conduta de atestar falsamente a regularidade fiscal da empresa requerida, concorreu diretamente, para a renovação ilegal do Regime Especial”.
“A partir da conduta dos requeridos servidores públicos, os requeridos Djalma Transportes e Representações Ltda., Djalma de Jesus Ferreira e Sonia Regina Ferreira, conseguiram incorporar, em seu patrimônio particular, valores oriundos do erário estadual, através da evasão fiscal”.