O juiz Gonçalo Antunes de Barros Neto, da 55ª Zona Eleitoral de Cuiabá, cassou os mandatos dos vereadores cuiabanos Abílio Brunini e Joelson Amaral, o Sargento Joelson, ambos do PSC, assim como dos suplentes, anulando os votos recebidos por eles.
A decisão foi dada nesta segunda-feira (2) e atendeu a uma ação de investigação promovida pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), que apontou fraude na composição da lista de candidatos do partido, em que foram incluídas candidatas “laranjas”, apenas para cumprir a cota de 30% por gênero.
Além da cassação, o magistrado puniu os candidatos Oséas Machado de Oliveira e José Marcos de Souza com a inelegibilidade por oito anos, contados a partir de 2016.
Nos últimos meses, pelos mesmos motivos, o juiz Gonçalo Neto cassou os mandatos de outros dois vereadores cuiabanos: Marcrean dos Santos (PRTB) e Elizeu Francisco do Nascimento (PSDC).
Na representação, o MPE afirmou que o PSC lançou algumas candidaturas femininas na eleição de 2016 apenas para preencher a cota de gênero, sem que as mesmas concorressem de fato.
Uma das candidatas foi Lúcia Carolina da Silva Gonçalves, que trabalha como atendente em uma farmácia.
Ela disse que se candidatou dois dias antes do prazo final a pedido do secretário-geral do PSC em Cuiabá, Valdinei Iori.
“Fui procurada por Iori, que precisava de mulheres para fechar a cota, porque já tinham muitos candidatos homens. Para me convencer a se candidatar ele afirmou que o partido forneceria estrutura financeira e material à minha campanha [...] Eu sequer cheguei a abrir conta de campanha porque recebi os documentos das mãos de Iory, era uma sexta-feira e na segunda-feira seguinte os bancos entraram em greve. Eu ainda tentei abrir conta para a campanha, mas encontrei muita resistência do Iori [...] Em razão da falta de estrutura que havia sido prometida, eu não realizei nenhum ato de campanha eleitoral”, disse ela, em trecho do depoimento.
Situação semelhante é a da “candidata” Ângela Maria Dias Moreira, que relatou sequer se lembrar o número pelo qual concorreu a vereadora.
“Me candidatei a pedido do Presidente do Partido, Eloi, e não cheguei a participar de qualquer reunião partidária para as eleições 2016 e nem mesmo compareci à Convenção Partidária. Eloi foi na minha casa afirmando que precisava de mulheres para fechar a cota, porque já tinham muitos candidatos homens. Eu sequer cheguei a abrir conta de campanha e não fiz campanha. Após pedir o registro da candidatura fui informada pelo pastor da minha igreja (Assembléia de Deus) de que já havia dois candidatos da igreja concorrendo ao pleito, de modo que eu deveria apoiar a candidatura de um deles. Em razão disso eu desisti de fazer campanha eleitoral. Os candidatos da igreja que já estavam concorrendo eram Abilio Jacques Brunini Moumer (Abilio Jr – Abilinho) e Marcrean Dos Santos Silva (Marcrean Santos)”, disse ela.
Ângela Moreira também contou que os dirigentes a informaram que ela contaria com apenas R$ 5 mil para fazer a campanha e que tal valor deveria ser devolvido posteriormente, “razão pela qual desistiu de concorrer”.
A terceira candidata “fantasma”, segundo o MPE, foi Derli Araújo da Silva, de 68 anos, que admitiu ter concorrido apenas para preencher cota.
“Não cheguei a abrir conta de campanha porque foi dito para mim que não havia verba do Partido e não tive qualquer movimentação financeira, nem mesmo cheguei a votar no primeiro turno das eleições de 2016. Não participei das convenções partidárias e quem pediu para eu me candidatar foi minha irmã Leocádia Araújo da Silva, que já foi candidata. O pedido decorreu da necessidade de terem mulheres para preencher a cota, para ajudar o Partido. Acredito que o Partido tenha cancelado meu registro de candidatura, porque eu adoeci uma semana antes da votação. Cheguei a comunicar o Partido, através do Sr. Ozeias Machado, que estava doente e não poderia fazer campanha e disseram que, depois, teria que abrir uma conta para prestação de contas, no entanto não me procuraram e a conta não foi aberta”, afirmou, em depoimento.
Os vereadores e dirigentes partidários, no entanto, negaram as acusações.
“Usadas como muletas”
Na decisão, o juiz Gonçalo Neto destacou que os dirigentes e gestores do PSC, para suprir a cota mínima de gênero, “valeram-se, até mesmo, da vulnerabilidade de senhoras idosas”.
“Além disso, se existisse o real interesse em impulsionar as três candidatas, o suporte a elas seria algo natural e efetivo. Mas o que se percebe é o oposto, restando claro que foram prestadas informações desconexas, a fim de desestimular qualquer tentativa de realização de campanha pelas candidatas”, disse.
Para o magistrado, ao invés de incentivar a participação feminina, o PSC preteriu as candidadas politicamente, que foram “usadas como muletas para apoiar fraudulentamente a candidatura de mais homens”.
Gonçalo Neto também registrou que as testemunhas de defesa do PSC não conseguiram afastar as acusações contidas na ação.
“A defesa dos representados não foi capaz de refutar os escusos fatos relatados pelas três candidatas, nem mesmo por meio da prova testemunhal produzida nestes autos. Pelo contrário, as provas dos autos são incisivas em demonstrar que o real interesse destes recrutamentos era alcançar o percentual mínimo exigido por lei, mesmo que isso significasse criar uma candidatura fictícia”, afirmou.
A intenção dos dirigentes partidários, conforme o magistrado, era apenas recrutar candidaturas fictícias para o preenchimento de cota/gênero, “uma vez que não pretendiam propulsioná-las, burlando a norma prevista no artigo 10, § 3°, da Lei n° 9.504/97, fato este que deve ser energicamente repudiado pelo Judiciário”.
“Cumpre destacar que inexiste previsão legal referente a atos mínimos a serem desempenhados pelo candidato durante a campanha eleitoral. Contudo, quando se cuida de fraude/burla ao comando legal, em especial ao preenchimento da cota/gênero, aos aspectos reais e específicos de cada candidatura deve-se somar a logística da agremiação partidária para determinado pleito eleitoral”, acrescentou.
Desta forma, o juiz Gonçalo Antunes concluiu pela existência de fraude na lista.
“Pelo exposto, julgo procedentes os pedidos iniciais para: a) Cassar os diplomas e os mandatos dos candidatos eleitos Abilio Jacques Brunini Moumer e Joelson Fernandes do Amaral, bem como dos suplentes vinculados ao Partido Social Cristão (arts. 15 e 22, inc. XIV, da Lei 64/90, com a redação dada pela LC nº 135/2010), declarando nulos os votos destinados a eles, devendo ser distribuídos aos demais partidos que alcançaram o quociente partidário (art. 109, do Código Eleitoral); b) Declarar inelegíveis Oseas Machado de Oliveira e José Marcos de Souza, pelo período de 08 (oito) anos subsequentes à eleição do ano de 2016 (art. 1º, inciso I, alínea d, LC nº 64/90, arts. 15 e 22, inc. XIV, da mesma lei complementar, com a redação dada pela LC nº 135/2010)”, decidiu.
O magistrado também remeteu cópia do processo ao MPE, para possíveis providências no campo disciplinar, de improbidade administrativa ou criminal e à Justiça Eleitoral, “para expedição de novos diplomas aos eleitos e primeiros suplentes”.