Eu tenho uma dívida de gratidão com o filósofo Olavo de Carvalho. Não sou aluno do COF, mas já assisti algumas de suas aulas e li quase toda a obra. Olavo de Carvalho me ajudou em dois pontos fundamentais, mas não os únicos: 1) a compreender a importância da consciência individual e a busca incansável pela verdade; 2) ampliar meu horizonte de consciência com uma bibliografia que eu jamais sonhava existir.
Assim foi no início dos anos 2000, quando me deparei com O Imbecil Coletivo e O Jardim das Aflições.
Por sinal, em relação ao ponto 1, guardo uma preciosa lição retirada de O Jardim das Aflições: tratar as minhas próprias opiniões a chicotadas para saber se elas se sustentam, pois não me interessa o apego ao que chamam de “opinião própria” se ela não for “opinião verdadeira”. Isso me ensinou a não ter pressa e a me fixar na sentença de Goethe, quando este afirma que é urgente ter paciência.
Numa terra onde todo mundo é especialista em tudo, todo mundo é poeta, atleta e físico quântico, aprendi também que há assuntos sobre os quais não tenho opinião alguma a não ser impressões. Isto faz com que – quando determinados pontos me interessam – eu tenha que me dedicar primeiro ao silêncio e à solidão do estudo para só depois utilizar da fala.
Dito isto, calar sobre Olavo de Carvalho – diante da sistemática campanha de difamação que ele vem sofrendo, sendo posto como “guru” de um governo – seria uma injustiça.
Provavelmente, Olavo de Carvalho nunca lerá o meu texto. Todavia, escrevo por dever de consciência e pela gratidão ao velho. Ainda que sem ser seu aluno, Olavo de Carvalho foi meu melhor professor.
Poderia aqui citar livro por livro. Demonstrar como Aristóteles Em Nova Perspectiva mudou a forma como eu encaro os discursos produzidos por aí, como eu analiso a lógica das coisas que eu escuto; como eu busquei me alfabetizar novamente ao encarar a leitura como atividade diária.
É que percebi as lacunas e deficiência de um sistema educacional em mim. Isto é pior do que ter sofrido um processo de doutrinação, pois é o que me fazia crente de determinadas certezas sem compreender o vasto universo de fontes primárias que contrariavam tudo aquilo que um dia eu acreditei.
Tal reaprendizado passa por compreender melhor a política cotidiana em suas pequenas ações, mas que escondem por trás algo bem maior que nos passa despercebido. É o que Olavo de Carvalho enxergou em um acontecimento até então desprezível e trouxe a reflexão que trouxe em O Jardim das Aflições. Todavia, mais que isso, é ir ao que realmente é Filosofia, com F maiúsculo.
Não foi Olavo de Carvalho que me tirou do niilismo. Outros autores – que encontrei por acaso – dentre eles Ortega y Gasset já estavam mudando a minha forma de enxergar o mundo. No entanto, como um autor vai puxando o outro, ao pesquisar sobre alguns destes me deparei com Olavo de Carvalho que me apresentou um mundo e um programa de leitura que busquei seguir a risca. Na obra dele, conheci Eric Voegelin, Viktor Frankl, Louis Lavelle e tantos e tantos, além de tudo que o próprio Olavo dizia.
Claro: há reflexões de Olavo de Carvalho sobre as quais não tenho opinião alguma. Natural quando comparo a minha estrada a dele. Nestes casos, exerço a humildade ao questionar o mestre com minhas dúvidas.
Mas, desconhecedora do todo, uma grande mídia recorta frases, fabrica mentiras, tira citações de contextos ou atribui ao filósofo aquilo que ele nunca disse. A intenção não é rebater o que Olavo de Carvalho pensa, mas destruí-lo por conta de interesses mesquinhos. Afinal, o pensador brasileiro cumpriu sua promessa: veio para foder com tudo e formar cidadãos capazes de ocupar espaço nessa guerra cultural.
Olavo de Carvalho fez o que se propôs. De forma direta, por meio do COF e de forma indireta, ajudando pessoas como eu, que não são alunos formais. Mas, penso em ser um aluno formal do professor. Há muito adio esta decisão. Foram vários os motivos. Na fase de estudante catador de moedas, era a questão financeira mesmo.
Ainda assim, por conta de Olavo de Carvalho e querendo conhecer mais do que ele dizia, lembro dos momentos em que ficava evitando gastos para juntar dinheiro para livros e mais livros. É, o professor também me ensinou a ter uma biblioteca.
Mas, quero ir além desse depoimento. Então, permita-me, caríssimo leitor a entrar em alguns pontos que considero o mínimo que você precisa saber sobre Olavo de Carvalho…
Recorro aqui a um texto assinado Ronald Robson em que – logo de cara – ele resume algo de forma perfeita e que, de alguma maneira, toquei também em meu primeiro parágrafo.
“A obra de Olavo de Carvalho possui uma intuição fundamental: a de que só a consciência individual é capaz de conhecimento. O que a afirmação possa ter de banal, em aparência, se esvai se notarmos que aí se fala de consciência individual, não se tratando tão somente de sujeito, o vocábulo descarnado de uso corrente na metafísica dos últimos séculos. Uma coisa é sujeito enquanto meramente contraposto a objeto em teoria do conhecimento; outra coisa é a modalidade de existência histórica de um ser dotado de consciência, que por definição só pode ser individual. E nisso importa prestar atenção à sutileza vocabular porque aí se afirma uma substância e se afirma uma sua propriedade: consciência individual, a primeira, e capacidade de conhecimento, a segunda. De um ponto de vista biográfico, a substância atualiza essa sua propriedade em um trauma de emergência da razão (2), que consiste no descompasso entre o crescente acúmulo de experiências do indivíduo, no decorrer do tempo, e a sua capacidade mais limitada de coerenciar e dar expressão a essa massa de fatos que, a princípio amorfa, pode se ordenar à medida que o indivíduo a expressar a si mesmo a ponto de nela se tornar discernível uma forma. A cada estágio traumático corresponde um padrão de autoconsciência, um eixo central de estruturação do indivíduo, ao menos a nível psicológico, que se pode melhor compreender mediante uma teoria das doze camadas da personalidade (3): pois, caracterologicamente, o desenvolvimento da psique pode ser apreciado em doze camadas distintas, umas integrativas (formam um quadro integrado estável), outras divisivas (estabelecem uma ruptura da ordem anterior que, assim, propicia uma nova ordem). A terceira camada, por exemplo, a qual em geral é objeto de escolas como a behaviorista e a Gestalt que equivocadamente, como fazem outras escolas, tomam uma camada da psique por sua própria substância (4) , compreende aquele período de esforço cognitivo concentrado para aquisição de saberes que permitam à pessoa (criança, aqui) se orientar no mundo com algum grau de independência, ao menos física; a quarta camada, divisiva e decisiva ao seu modo, que afinal foi o verdadeiro objeto de estudo de Freud e Klein, abarca a história pulsional do indivíduo preocupado sobretudo com sua afetividade, com o querer e sentir-se querido; e com a quinta camada, integrativa e de individuação (Jung), já começa a surgir o problema objetivo de quais são os propósitos reais do indivíduo e como alcançá-los a questão deixa de ser de afetividade, passa a ser de poder. E assim por diante, a passar por camadas que apenas podem ser alcançadas, mas não necessariamente, como a da síntese individual (oitava), a da personalidade intelectual (nona) ou mesmo a do destino final (décima segunda)”.
Este é um ponto que de fato fez diferença para mim. Aconselho aos amigos a leitura completa do artigo de Ronald Robson. Deixarei o link aqui nesse meu texto. Melhor que eu, o autor destaca ainda o direcionamento que Olavo de Carvalho dá a uma técnica filosófica específica que é posta em sete pontos:
“1. A anamnese pela qual o filósofo rastreia a origem das suas ideias e assume a responsabilidade por elas; 2. A meditação pela qual ele busca transcender o círculo das suas ideias e permitir que a própria realidade lhe fale, numa experiência cognitiva originária; 3. O exame dialético pelo qual ele integra a sua experiência cognitiva na tradição filosófica, e esta naquela; 4. A pesquisa histórico-filológica pela qual ele se apossa da tradição; 5. A hermenêutica pela qual ele torna transparentes para o exame dialético as sentenças dos filósofos do passado e todos os demais elementos da herança cultural que sejam necessários para a sua atividade filosófica; 6. O exame de consciência pelo qual ele integra na sua personalidade total as aquisições da sua investigação filosófica; 7. A técnica expressiva pela qual ele torna a sua experiência cognitiva reprodutível por outras pessoas”.
Olavo de Carvalho me ensinou a compreender algo que se faz presente em uma de suas citações que mais me marcou: “Tudo em volta induz à loucura, ao infantilismo, à exasperação imaginativa. Contra isso o estudo não basta. Tomem consciência da infecção moral e lutem, lutem, lutem pelo seu equilíbrio, pela sua maturidade, pela sua lucidez. Tenham a normalidade, a sanidade, a centralidade da psique como um ideal. Prometam a vocês mesmos ser personalidades fortes, bem estruturadas, serenas no meio da tempestade, prontas a vencer todos os obstáculos com a ajuda de Deus e de mais ninguém. Prometam SER e não apenas pedir, obter, sentir, desfrutar”.
Sabendo disso, caros amigos, se você ainda não conhece Olavo de Carvalho ou começa a ouvir sobre ele por recortes feitos pela grande mídia, desconfie desses chamados “perfis biográficos” para identificar o “guru” da direita ou “ideólogo” de um governo. O professor nunca foi um ideólogo. Vá além desse mar de lama. Procure se debruçar sobre O Mínimo Que Você Precisa Saber Para Não Ser Um Idiota. Leia cada artigo ali presente com a atenção merecida.
O Mínimo Que Você Precisa Saber Para Não Ser Um Idiota é uma boa introdução ao estudo do pensamento do filósofo, ainda que seja, como o próprio nome diz, apenas o mínimo. Depois busque as obras filosóficas como Visões de Descartes, Aristóteles Em Nova Perspectiva, O Jardim das Aflições, sem abrir mão de querer conhecer Dialética Simbólica e o maravilhoso texto sobre o filme O Silêncio dos Inocentes. Sem deixar de conhecer os volumes de artigos que estão sendo publicados pela Vide Editorial e demais obras.
Por fim, agradeço a paciência do leitor que até aqui chegou.
No mais, muito obrigado professor. Obrigado por tudo. Sei que o senhor já foi elogiado por gente muito mais importante e minhas palavras aqui representam pouco. Porém, não poderia silenciar diante dos ataques que o senhor vem sofrendo. Não poderia me calar diante da injustiça, uma vez que sem os seus ensinamentos seria mais difícil encontrar o saber que sempre estive a buscar. Que Deus o ilumine, professor. Que Nosso Senhor Jesus Cristo sempre esteja presente. Mais uma vez, obrigado por travar a batalha!
PS: o link do texto citado por mim: https://mailchi.mp/olavodecarvalho.org/elementos